O budismo é uma religião indiana baseada nos ensinamentos de Sidarta Gautama, conhecido como o Buda. De caráter filosófico[1][2] e não teísta,[2] surgiu na Índia Antiga como uma tradição ascética entre os séculos VI e IV a.C. Atualmente é a quarta maior religião do mundo,[3] com mais de 520 milhões de seguidores (cerca de 7% a 8% da população global),[4] conhecidos como budistas. No Brasil, segundo o censo de 2010, residem aproximadamente 245 mil budistas.[5][6] Em Portugal, há cerca de 64 mil budistas.[7] O budismo abrange diversas tradições, crenças e práticas espirituais baseadas nos ensinamentos do Buda e em suas interpretações. Os dois maiores ramos do budismo são o theravāda (“Escola dos Anciões” em páli) e o mahāyāna (“O Grande Veículo” em sânscrito).[8]
Como expresso nas Quatro Nobres Verdades do Buda, a meta do budismo é a superação do sofrimento (dukkha) causado pelo desejo e pela ignorância em relação à verdadeira natureza da realidade, formada pela impermanência e pela inexistência da alma dos seres vivos.[9] A maioria das tradições budistas se concentram na superação do eu individual através da conquista do nirvana ou da busca do caminho de Buda, o que leva ao fim do ciclo de morte e renascimento.[10][11][12] As escolas do budismo divergem em suas interpretações sobre a natureza exata do caminho para a libertação, a importância e a canonicidade dos textos budistas e, especialmente, seus ensinamentos e suas práticas.[13][14] Entretanto, as bases de todas as tradições e práticas são as Três Joias: o Buda (o mestre), o dharma (os ensinamentos baseados nas leis do universo) e a sangha (a comunidade budista).[15] Encontrar refúgio espiritual nas Três Joias ou Três Tesouros é, em geral, o que distingue um budista de um não-budista.[16] Outras práticas incluem a renúncia à vida secular para se tornar um monge (bhikkhu) ou monja (bhikkhuni), a meditação e o cultivo das paramitas.
O budismo theravada é amplamente seguido no Sri Lanka e em países do Sudeste Asiático, como Camboja, Laos, Mianmar e Tailândia. A tradição mahayana, que inclui escolas como o Zen (Chan), a Terra Pura, o Nichiren, o Shingon e o Tendai (Tiantai), é mais difundida nos países do Leste Asiático, tais como China, Coreia, Japão, Singapura, Taiwan e Vietnã. O vajrayana, um conjunto de ensinamentos surgidos nas comunidades tântricas da Índia, pode ser visto tanto como uma escola separada do budismo quanto como uma tradição esotérica do budismo mahayana. Seu maior expoente, o budismo tibetano, é praticado na região dos Himalaias (Butão, Nepal, Tibete e partes da Índia), na Mongólia e nas repúblicas de Buriácia, Calmúquia e Tuva da Federação Russa. Na Índia, a tradição mais seguida é a navayana (“Novo Veículo” em sânscrito), um movimento neo-budista fundado por B.R. Ambedkar, que rejeitou as doutrinas originais das tradições theravada e mahayana para interpretar o budismo sob um viés de luta de classes. Ele inspirou milhares de dálites, membros da casta inferior no hinduísmo, a se converterem ao budismo.
Índice
- 1A vida de Buda
- 2Conceitos budistas
- 3Escolas
- 4Nirvana
- 5Origens
- 6Cosmologia
- 7Escrituras
- 8Difusão do budismo
- 9Ver também
- 10Bibliografia
- 11Notas
- 12Referências
- 13Ligações externas
A vida de Buda
Ver artigo principal: Sidarta GautamaA grande estátua do Buda Amitaba em Kamakura, no Japão.
De acordo com a narrativa convencional, o Buda nasceu em Lumbini (hoje, patrimônio mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) por volta do ano 566 a.C. e cresceu em Capilvasto:[17] ambos, atuais localidades nepalesas.[18][19] Logo após o nascimento de Sidarta, um astrólogo visitou o pai do jovem príncipe, Suddhodana, e profetizou que Sidarta ou iria se tornar um grande rei, ou renunciaria ao mundo material para se tornar um homem santo se, porventura, visse a vida fora das paredes do palácio.
O rei Suddhodana estava determinado a ver o seu filho se tornar um rei e, assim, impediu que ele saísse do palácio. Mas, aos 29 anos, apesar dos esforços de seu pai, Sidarta se aventurou por além do palácio diversas vezes. Em uma série de encontros (em locais conhecidos pela cultura budista como “quatro pontos”),[20] ele soube do sofrimento das pessoas comuns, encontrando um homem velho, um outro doente, um cadáver e, finalmente, um asceta sadhu, representando a busca espiritual. Essas experiências levaram Gautama, finalmente, a abandonar a vida material e ir em busca de uma vida espiritual.
Sidarta Gautama estudou sob diferentes mestres e desencantou-se com o resultado alcançado pelo que ensinavam. Chegou a praticar ascese rígida, como jejum prolongado, restrição da respiração, e outras formas de exposição a dor, muito comuns naquele tempo na Índia, e quase morreu ao longo do processo. Mas houve um episódio no qual uma jovem lhe ofereceu comida e ele aceitouː isso marcou sua renúncia a tais práticas. Concluiu que as práticas ascéticas extremas não traziam os resultados que buscava. Deduziu, então, que as práticas eram prejudiciais aos praticantes.[21] Ele abandonou o ascetismo, concentrando-se na meditação anapanasati, através da qual descobriu o que hoje os budistas chamam de “caminho do meio“: um caminho que não passa pela luxúria e pelos prazeres sensuais, mas que também não passa pelas práticas de mortificação do corpo.[22] Em outras palavras, o caminho do meio não seria o caminho do apego a qualquer coisa, nem também o caminho da negação ou aversão a qualquer coisa, e sim uma terceira via.Gautama com seus cinco companheiros, que, mais tarde, compuseram a primeira Sangha (comunidade monástica budista). Pintura da parede de um templo no Laos.
Quando tinha 35 anos de idade, Sidarta sentou-se embaixo de uma figueira-dos-pagodes (Ficus religiosa)[23][24] hoje conhecida como árvore de Bodhi,[22] localizada em Bodh Gaya, na Índia, e prometeu não sair dali até conseguir atingir a iluminação espiritual.[25][26][27]
A lenda diz que Sidarta conheceu a dúvida sobre o sucesso de seus objetivos ao ser confrontado por um demônio chamado Mara, que simboliza o mundo das aparências, a tentação, comparado ao papel de Satanás no cristianismo, e muitas vezes representado por uma cobra naja. Mara teria oferecido todos os tipos de prazeres e tentações a Sidarta, que, implacavelmente, repeliu Mara. Vencido Mara, Sidarta acordou para a Verdade, a Verdade da origem, da cessação e do caminho que levava ao fim do sofrimento, e se iluminou. Assim, por volta dos quarenta anos, Sidarta se transformou no Buda, o Iluminado.
Logo, atraiu um grupo de seguidores e instituiu uma ordem monástica. A partir de então, passou seus dias ensinando o darma, viajando por toda a parte nordeste do subcontinente indiano. Ele sempre enfatizou que não era um deus e que a capacidade de se tornar um buda pertencia ao ser humano. Faleceu aos oitenta anos de idade, em 483 a.C., em Kushinagar, na Índia.
Os estudiosos contradizem-se em relação às afirmações sobre a história e os fatos da vida de Buda. A maioria aceita que ele viveu, ensinou e fundou uma ordem monástica, mas não aceita de forma consistente os detalhes de sua biografia. Segundo o escritor Michael Carrithers, em seu livro O Buda, o esboço de uma vida tem que ser verdadeiro: o nascimento, a maturidade, a renúncia, a busca, o despertar e a libertação, o ensino e a morte.[28]
Ao escrever uma biografia sobre Buda, Karen Armstrong disse: “É obviamente difícil, portanto, escrever uma biografia de Buda, atendendo aos critérios modernos, porque temos muito pouca informação que pode ser considerada ‘histórica’… mas podemos estar razoavelmente confiantes, pois Siddhartta Gautama realmente existiu e os seus discípulos preservam a sua memória, sua vida e seus ensinamentos”.[29]
Conceitos budistas
A vida e o mundo
Carma: lei de causa e efeito
Ver artigo principal: Carma no budismoTradicional thangka do budismo tibetano alusivo à “Roda da Vida”, com seus seis reinos.
No budismo, o Carma (do sânscrito कर्म, transl. karmam, e em pali, kamma, “ação”) é a força de samsara sobre alguém. Boas ações (páli: kusala), e/ou ações ruins (páli: akisala) geram “sementes” na mente,[30] que virão a aflorar nesta vida ou em um renascimento subsequente.[31] Com o objetivo de cultivar as ações positivas, o sila é um conceito importante do budismo, geralmente, traduzido como “virtude”, “boa conduta”, “moral” e “preceito”.
O carma, na filosofia budista, refere-se especificamente a essas ações (do corpo, da fala e da mente) que brotam da intenção mental (páli: cetana)[32] e que geram consequências (frutos) e/ou resultados (vipaka). Cada vez que uma pessoa age, há alguma qualidade de intenção em sua mente e essa intenção muitas vezes não é demonstrada pelo seu exterior, mas está em seu interior e determinará os efeitos dela decorrentes.Monumento budista na área de Horyu-ji, no Japão
No budismo Teravada, não pode haver salvação divina ou perdão de um carma, uma vez que é um processo puramente impessoal que faz parte do Universo. Outras escolas, como a Maaiana, porém, têm opiniões diferentes. Por exemplo, os textos dos sutras (como o Sutra do Lótus, Sutra de Angulimala e Sutra do Nirvana) afirmam que, recitando ou simplesmente ouvindo seus textos, as pessoas podem expurgar grandes carmas negativos. Da mesma forma, outras escolas, Vajrayana por exemplo, incentivam a prática dos mantras como meio de cortar um carma negativo.[33]
Renascimento
Ver artigo principal: Renascimento
Renascimento refere-se a um processo pelo qual os seres passam por uma sucessão de vidas como uma das muitas formas possíveis de senciência. Entretanto, o budismo, natural da Índia, rejeita conceitos de “autoestima” permanente ou “mente imutável”, eterna, como é chamada no cristianismo e até mesmo no hinduísmo, pois, no budismo, existe a doutrina do anatta, sobre a inexistência de um “eu” permanente e imutável.
De acordo com o budismo, o renascimento em existências subsequentes deve antes ser entendido como uma continuação dinâmica, um constante processo de mudança – “originação dependente” (sânscrito: pratītya-samutpāda) – determinado pelas leis de causa e efeito (carma), em vez da noção de um ser encarnado ou transmigrado de uma existência para outra.
Cada renascimento ocorre dentro de um dos seis reinos, de acordo com os nossos reinos de desejos, podendo variar de acordo com as escolas:[34][35][36]
- Reino dos seres dos infernos: aqueles que vivem em um dos muitos infernos;
- Reino dos fantasmas famintos: o reino de seres que padecem de necessidades sem alívio, sofrimento, remorsos, fome, sede, nudez, miséria, sintomas de doenças, entre outros;[36]
- Reino animal: um espaço de divisão com os humanos, mas considerado como outra vida;
- Reino dos seres humanos: um dos reinos de renascimento, em que é possível atingir o nirvana;
- Reino dos semideuses: variavelmente traduzido como “divindades humildes”, titãs e antideuses; não é reconhecido pelas escolas Teravada e Maaiana, que os consideram como devas de nível mais baixo;
- Reino divino: comparado ao paraíso.[36]
O renascimento em alguns dos céus mais altos, conhecido como o mundo de Śuddhāvāsa (moradas puras), pode ser alcançado apenas por pessoas com enorme realização espiritual, conhecidos como não regressistas (sânscrito: anāgāmis). Já o renascimento no reino sem forma (sânscrito: arupa-dhatu) pode ser alcançando apenas por aqueles que podem meditar sobre o arupajhanas, o maior objeto de meditação.
De acordo com o budismo praticado no leste asiático e o budismo tibetano, há um estado intermediário (o bardo) entre uma vida e a próxima. A posição Teravada ortodoxa rejeita esse conceito, no entanto existem passagens no Samyutta Nikaya do Cânone Páli (coleção de textos em que a tradição Teravada é baseada) que parecem dar apoio à ideia de que o Buda ensinou que existe um estado intermediário entre esta vida e a próxima.
O ciclo de samsara
Ver artigo principal: Samsara
Samsara é o ciclo das existências nas quais reinam o sofrimento e a frustração engendrados pela ignorância e pelos conflitos emocionais que dela resultam.[37] O samsara compreende os três mundos superiores (deva, espiritual e seres humanos) e os três inferiores (seres ignorantes, inferiores e animais), julgados não por um valor, mas em função da intensidade de sofrimento.[38]
Os budistas acreditam, em sua maioria, no samsara. Este, por sua vez, é regido pelas leis do carma: a boa conduta produzirá bom carma e a má alma produzirá carma maléfico. Assim como os hindus, os budistas interpretam o samsara não esclarecido como um estado de sofrimento. Só nos libertaremos do samsara se atingirmos o estado total de aceitação, visto que nós sofremos por desejar coisas passageiras, e alcançarmos o nirvana ou a salvação.[39]
Sofrimento: causas e soluções
As Quatro Nobres Verdades
Ver artigo principal: Quatro Nobres Verdades
De acordo com o Cânone Páli, As Quatro Nobres Verdades foram os primeiros ensinamentos deixados pelo Buda depois de atingir o nirvana.[40] Algumas vezes, são consideradas como a essência dos ensinamentos do Buda e são apresentadas na forma de um diagnóstico médicoː[41]
- a vida como a conhecemos é finalmente levada ao sofrimento e/ou mal-estar (dukkha), de uma forma ou outra;
- o sofrimento é causado pelo desejo (trishna). Isso é, muitas vezes, expressado como um engano agarrado a um certo sentimento de existência, a individualidade, ou para coisas ou fenômenos que consideramos causadores da felicidade e infelicidade. O desejo também tem seu aspecto negativo;
- o sofrimento acaba quando termina o desejo. Isso é conseguido através da eliminação da ilusão (maya). Assim, alcançamos o estado de libertação do iluminado (bodhi);
- esse estado é conquistado através dos caminhos ensinados pelo Buda.
Esse método é descrito por alguns acadêmicos ocidentais e ensinado como uma introdução ao budismo por alguns professores contemporâneos do Maaiana, como por exemplo o 14º Dalai Lama,[42] Tenzin Gyatso.
De acordo com outras interpretações de mestres budistas e eruditos, e recentemente reconhecidas por alguns estudiosos ocidentais não budistas, as “verdades” não representam meras declarações e/ou indicações, entretanto estas podem ser agrupadas em dois grupos:[43]
- o sofrimento e as causas do sofrimento;
- a cessação do sofrimento e os caminhos para a libertação.
Assim, a Enciclopédia Macmillan de Budismo simplifica As Quatro Nobres Verdades, deixando-as da seguinte maneira:
- “A Verdade Nobre Que Está Sofrendo”;
- “A Verdade Nobre Que É O Surgimento do Sofrimento”;
- “A Verdade Nobre Que É O Fim do Sofrimento”;
- “A Verdade Nobre Que Produz o Caminho para o Fim do Sofrimento”.
A compreensão tradicional do teravada sobre As Quatro Nobres Verdades é que estas são um ensino avançado para aqueles que estão “prontos”.[44] A posição maaiana é que eles são ensinamentos prejudiciais para as pessoas que ainda não estão prontas para ensinar.[32] No Extremo Oriente, os ensinamentos são pouco conhecidos.[45]
Fonte da informação: https://pt.wikipedia.org/wiki/Budismo